segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Infecções são causa de 30% das internações de quem tem câncer


GABRIEL ALVES
DE SÃO PAULO
28/09/2015  02h00
Um levantamento do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octavio Frias de Oliveira) mostra que 30% das internações de pacientes com câncer se devem a infecções generalizadas (também conhecida como sepse), o que equivale a cerca de 100 pacientes por mês na instituição.

O objetivo do estudo é ressaltar a importância de os hospitais padronizarem o atendimento a quem tenha suspeita de sepse –isso acontece no Icesp, mas não em boa parte dos hospitais, o que deve fazer com que os números sejam ainda mais altos em outras instituições.

Um dos problemas é que os sintomas são inespecíficos, o que significa que o diagnóstico nem sempre é imediato.

No caso de pacientes com câncer, é especialmente preocupante. O organismo já é naturalmente imunologicamente mais frágil nesses pacientes, o que justifica tomar uma série de cuidados, como, por exemplo, lavar as mãos e ter bons hábitos de higiene.

O choque séptico é a forma mais grave da sepse, quando a função dos órgãos já está comprometida. O índice de mortalidade no país é de 55%. Na Europa, América do Norte e Austrália o índice é de 25%, de acordo com a cardiologista especialista em UTI do Icesp, Ludhmila Abrahão Hajjar, que também é professora da Faculdade de Medicina da USP.

Infográfico: Caminho da infecção
TRATAMENTO DE CÂNCER
O próprio tratamento contra o câncer podem aumentar o risco de infeção, explica o oncologista do Centro Oncológico da Beneficência Portuguesa de São Paulo Fernando Maluf.

Isso porque técnicas como a quimioterapia e a radioterapia também podem agredir as células brancas do sangue ou provocar lesões locais, respectivamente.
No primeiro caso, o organismo perderia a principal linha de defesa interna ao organismo. Já no segundo, as lesões funcionam como porta de entrada para germes.

No entanto, as chances variam de acordo com o tipo de tumor. No caso de um câncer no sangue como a leucemia, por exemplo, a chance de a internação se dever a uma infecção é muito maior do que quando uma mulher está fazendo controle de metástase com uma quimioterapia, diz Maluf.

No tratamento de alguns cânceres mais complicados, que apresentam risco de gerar infecção, podem ser administrados antibióticos profilaticamente e existe até um medicamento injetável que é capaz de estimular a produção de células brancas para proteger o organismo.

Uma doença aumenta aumenta muito agressividade da outra, explica Ludhmila: um paciente com câncer tem uma chance maior de morrer.

"O pior é que depois do choque séptico, a pessoa fica pelo menos 20 dias internada. O paciente fica débil, fraco, desnutrido e para voltar ao tratamento oncológico pode demorar de meses a anos."

A sepse atinge 400 mil pessoas anualmente no país e grande parte das pessoas morre por conta de uma demora em iniciar o tratamento –algumas horas podem fazer a diferença.

Entre as possíveis causas da da infecção generalizada e do choque séptico estão infecções mal resolvidas, como a urinária, a gástrica ou mesmo uma pneumonia. Os pacientes que tenham infecções recorrentes também devem estar atentos e procurar um médico.

A reação inflamatória provocada pelos micróbios acaba afetando o funcionamento de todos os órgãos, lesando os tecidos e prejudicando seu funcionamento normal. "O rim para, o fígado para é complicado", diz a médica.
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CAMINHO DA INFECÇÃO
Por que a sepse é um problema (também) para quem tem câncer
30%
é a fração de internações de pacientes com câncer por causa de infecções*
55%
é o índice de mortalidade de sepse no Brasil
400 mil
novos casos de sepse são relatados por ano no Brasil

DICAS QUE VALEM PARA TODOS, COM CÂNCER OU NÃO
> Lavar as mãos frequentemente
> Procurar um médico no caso de infecções recorrentes
> Não tomar antibióticos por conta própria

Fonte: Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octavio Frias de Oliveira), Fernando Maluf (oncologista); Estudo Spread 

terça-feira, 22 de setembro de 2015

'Science': A aposta nas células-tronco tumorais


Pesquisadores esperam que testes clínicos provem teoria controversa e ofereça novos tratamentos

A Science, renomada revista científica, publicou recentemente um artigo de Jocelyn Kaiser sobre um estudo que vem sendo feito no combate ao câncer. Robert Weinberg é um dos pesquisadores de câncer mais conhecidos do mundo, graças em grande parte a seu trabalho pioneiro na identificação de genes que baseiam o desenvolvimento de tumores. 
Ele já viu a esperança para tratamentos de câncer ir e vir. 

“Estou nesse ramo, para o bem ou para o mal, há 40 anos. Muitas das coisas nas quais trabalhamos se mostraram relativamente inúteis na clínica.” Mas, aos 72 anos, ele está otimista de novo. “Essa é realmente a primeira vez onde eu estou posicionado para ajudar a efetuar o desenvolvimento de um agente ou de agentes que realmente vão beneficiar pacientes de câncer,” diz ele.

O pesquisador do Instituto de Tecnologia de Massachusetts está agora arriscando parte de sua considerável reputação, e quase US$ 200 milhões que investidores deram a uma empresa da qual ele é um co-fundador, em uma ousada teoria que dividiu o campo do câncer. Weinberg e outros argumentam que tumores contém um pequeno número de células que são distintas porque elas parecem com as células-tronco que dão origem a tecidos normais. Eles acreditam que essas sementes do câncer, capazes de resistir à quimioterapia e voltar meses ou anos depois do  tratamento, podem explicar os trágicos recaídas que as pessoas costumam experimentar. Acredita-se que ao mirar especificamente nessas células tronco tumorais, será possível manter a doença sob controle.

A Verastem Inc., empresa de Weinberg em Needham, Massachusetts, é uma das várias que estão lançando uma nova rodada de testes clínicos para descobrir se a teoria realmente funciona. Além da promessa de mudar o tratamento de câncer, tos riscos financeiros são enormes. A OncoMed Pharmaceuticals Inc., outra líder nessa área, poderia ganhar US$ 5 milhões em financiamento adicional de grandes empresas farmacêuticas se seus testes obtiverem sucesso.

Mas como Weinberg e outros no campo reconhecem, pode ser difícil traçar conclusões definitivas dessas experiências. Diferente da quimioterapia tradicional, não se espera que as drogas que estão passando por testes diminuam rapidamente os tumores, porque elas são desenvolvidas para matar só os minúsculos subgrupos de células que semeiam e reabastecem o principal tumor. Logo, detectar se as drogas estão funcionando na maneira que se pretende não é simples. Realmente, para tumores sólidos, os pesquisadores carecem de análises simples, rigorosas para medir o número de células-tronco tumorais. De acordo com o modelo de célula-tronco tumoral, a quimioterapia mata o grosso das células cancerígenas mas raras células-tronco tumorais permanecem intactas. Essas células em seguida semeiam um novo crescimento do tumor. Matar as células-tronco poderia levar à regressão do tumor com o tempo, mas combinar uma droga que detenha as células-tronco tumorais com a quimioterapia poderia ser ainda mais rápido.

Os estudos também enfrentam um forte ceticismo: muitos ainda não acreditam que as células tumorais existam como um tipo de célula diferente de outras células tumorais, e alguns sugerem que as empresas estão alardeando ou pelo menos simplificando demais a premissa. Uma vitória na clínica poderia solucionar parte da controvérsia. “Eu acho que o ônus está sobre todos nós na comunidade que estamos desenvolvendo terapias de células-tronco tumorais para mostrar sem dúvida que essas terapias realmente funcionam,” diz Max Wicha da Universidade de Michigan, Ann Arbor.


Por enquanto, pacientes com câncer, pesquisadores e investidores em empresas como a Verastem vão esperar ansiosamente pelos dados para começar os exames clínicos. Para quem se interessa em tratamentos, os resultados poderão trazer esperança. Porém, para pesquisadores que debatem a realidade das células cancerígenas, elas podem não trazer uma resolução. Jeremy Rich da Cleveland Clinic em Ohio, que está estudando células-tronco no câncer de cérebro, afirma: “Até mesmo se obtivermos um grande sucesso, o que não acredito que vai acontecer, não acho que haverá uma resposta em preto e branco”.