Mostrando postagens com marcador Câncer no século XXI. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Câncer no século XXI. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Novidades em tratamentos oncológicos aumentam esperança de pacientes

Alguns anos atrás, acreditava-se que não havia vitória no combate ao câncer, com a evolução da medicina oncológica, os tratamentos foram se mostrando eficientes para dar mais qualidade de vida aos pacientes tratados. A Revista conversou com especialistas que contaram o que há de novo nesses tratamentos

O câncer é a segunda causa de morte em todo o planeta, ficando atrás apenas das doenças cardiovasculares, mas a estimativa é que assuma a liderança do ranking até 2025, quando deverá ser responsável por 6 milhões de falecimentos no ano.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), atualmente 43,8 milhões de pessoas no planeta vivem os cinco anos de prevalência da doença, sendo que 1,3 milhão delas estão no Brasil. Considerando apenas as estimativas de novos casos previstos pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca), até o final do último ano, 625 mil brasileiros foram diagnosticados com câncer. Diante desse cenário, um dos questionamentos que surge é de que forma o sistema de saúde brasileiro tem se preparado para atender essa demanda.

O oncologista, fundador e presidente do Conselho de Administração do Grupo Oncoclínicas, Bruno Ferrari, explica que do ponto de vista técnico, a qualidade dos profissionais brasileiros não deixa a desejar de nenhum americano, asiático ou europeu. “O que existia de gap no Brasil era estrutural, além de estratégias e projetos que olhassem a oncologia a longo prazo.”

Para ele, está sendo construído um perfil específico da oncologia brasileira. “Ela deixa de ser nos últimos anos uma oncologia de alto nível técnico mas muito espelhada no que acontece fora do Brasil de uma maneira não estruturada, para uma linha de cuidado mais específica com um DNA nacional.”

Bruno Ferrari detalha que o tratamento oncológico oferecido no Brasil é de alta qualidade. “Obviamente é preciso melhorar os incentivos às pesquisas e outras estratégias de acesso para que todos os brasileiros tenham amplo acesso ao diagnóstico precoce e às melhores alternativas de tratamento. Mas estamos evoluindo e, mesmo com a pandemia, vimos os sistemas de saúde público e privado se organizarem para assegurar fluxos seguros a pacientes de outras doenças que necessitam ir aos hospitais, caso de muitos pacientes oncológicos.”

 

O que há de novo?

 

Robôs no suporte às cirurgias

As novas abordagens no tratamento oncológico incluem práticas inovadoras para a retirada de diferentes tumores. A cirurgiã torácica, líder de cirurgia do Grupo Oncoclínicas, Paula Ugalde, explica que tais avanços são devido a fusão da tecnologia com a medicina. “Essas práticas estão conquistando espaços importantes nas condutas oncológicas. Nesse sentido, o uso da robótica já faz parte do presente no tratamento do câncer e compõe o arsenal de alternativas que melhoram a qualidade de vida dos pacientes. Esses procedimentos cirúrgicos inovadores reduzem o tempo de internação, de exposição a infecções e contribuem efetivamente para o bem-estar do paciente.”

A integração da robótica aos procedimentos oncológicos, têm permitido a realização de cirurgias cada vez mais complexas, e minimamente invasivas. “Quando falamos em procedimentos minimamente invasivos, estamos na prática dizendo que há menor agressão ao paciente — quando operamos um paciente, estamos 'machucando' o corpo para tratar uma condição específica. Quanto menos a gente mexe com o corpo dessa pessoa, menos 'agride', melhor é a recuperação no geral”, detalha Paula Ugalde.

A evolução nos tratamentos de câncer se deve ao uso das tecnologias robóticas. Nas Américas, o Brasil é um dos países que têm mais robôs, para os pacientes com câncer, o resultado é excelente. “Podemos dizer que isso se traduz esteticamente em cicatrizes menos visíveis ou até mesmo inexistentes e obviamente em uma recuperação pós-cirúrgica facilitada, que contribui positivamente em toda a jornada de combate ao câncer e bem-estar como um todo do paciente.”

 

Genômica: essencial e cada vez mais presente no combate ao câncer

A individualização da linha de cuidado integral, desde o diagnóstico mais preciso até a definição da conduta de tratamento mais indicada, tende a ditar o tom para o tratamento de câncer agora e nos próximos anos. “Com o rastreamento do genoma e do DNA desses tumores, conseguimos saber suas particularidades e assim, encontrar a melhor forma de combater o seu avanço. E isso tem sido feito e os avanços nesses mapeamentos acontecem todos os dias, coletamos informações clínicas e genéticas para construirmos a base da inovação científica”, conta Rodrigo Dienstmann, diretor científico da Oncoclínicas Precision Medicine.

E se o diagnóstico precoce do câncer segue sendo o jeito mais efetivo de garantir melhores chances de respostas às terapêuticas aplicadas, a chamada oncologia de precisão traz respostas assertivas para que a medicação adotada atinja o alvo com grande acurácia, sob medida para as características da doença de cada indivíduo. “Isso significa que, com a ajuda da análise dos biomarcadores tumorais, ou seja, das alterações genéticas identificadas nas células daquele tumor específico e que trazem importantes informações para nos ajudar a desvendar o mecanismo da doença de acordo com cada caso de forma personalizada, podemos oferecer as melhores alternativas de tratamento em prol da qualidade de vida do paciente”, ressalta o especialista.

Bruno Ferrari conta que falar em prever o futuro da oncologia no atual cenário é um desafio, mas o acúmulo de dados integrando a genômica vai ter um grande impacto na seleção de tratamento e no suporte continuado ideal. “Eu acredito que a genômica, como outras tecnologias, vai permitir um olhar de lupa nos tumores; vamos individualizar ainda mais o tratamento de maneira real e já estamos chegando nesse momento. Eu não vejo alternativa pro futuro se não integrar a genômica à prática rotineira da oncologia.”

 

Imunoterapia avança para outros tratamentos

A ciência como aliada da prática médica se aplica ainda ao desenvolvimento de medicações cada vez mais personalizadas. Neste sentido, Carlos Gil enfatiza a ampliação do uso da imunoterapia no tratamento de mais tipos de câncer. Segundo ele, a técnica consiste em fortalecer certos aspectos da imunidade do paciente para que o próprio corpo combata o tumor. A verdadeira “arma secreta” contra o câncer, diz ele, está em nós mesmos:

“Os imunoterápicos já são parte da nossa realidade e tendem a se aperfeiçoar e ganhar espaço. Há cerca de dois anos esse tipo de medicação era usada apenas em alguns poucos casos de câncer, como o melanoma — tipo de câncer de pele — , mas agora ela já tem sido recomendada para tipos de tumores nas mamas, nos rins, gastrointestinais, pulmão, leucemia, linfoma e sarcoma. E não deve parar por aí”, destaca.

“A imunoterapia veio para ficar e nesse futuro próximo figura como alternativa bastante viável para o enfrentamento do câncer com ainda mais assertividade”, detalha Bruno Ferrari. Segundo o profissional, existe uma expectativa de que em 2023, 70% dos pacientes com câncer serão candidatos a alguma forma de imunoterapia - tratamento que consiste em estimular com uso de medicação o sistema imunológico do paciente para que ele reconheça as células malignas e as combata. “É um caminho se integrando de forma inteligente ao tratamento.”

Universalização do acesso às melhores condutas aos pacientes e compartilhamento de conhecimento entre especialistas caminham lado a lado

“O atendimento oncológico pode e deve ser multidisciplinar, integral e simultâneo. O que praticamos durante o simpósio de forma explicativa é o que queremos praticar no nosso dia a dia”, diz o oncologista Sergio Jobim Azevedo, coordenador científico do 8º Simpósio Internacional Oncoclínicas, que aconteceu em novembro de 2020.

Para ele, esse processo de democratizar e universalizar o conhecimento médico é amplamente favorecido pelo formato digital, uma das heranças positivas da pandemia. “Toda a programação foi disponibilizada de forma gratuita para médicos, estudantes de medicina e outras profissionais de saúde. Uma pessoa que está no extremo norte ou sul do país pode compartilhar desse momento”, reforça.

“O valor da cooperação entre especialistas é uma das principais mensagens que trouxemos. Tivemos a oportunidade de reunir os maiores especialistas em oncologia clínica, cirurgia oncológica e análise genética do Brasil e exterior para debater o que há de mais avançado nestes segmentos e compartilhar este conhecimento com médicos de todo o país. Unir as equipes envolvidas na linha de cuidado com certeza agrega muito no resultado final para o paciente”, acrescenta Sergio Azevedo. Ele ressalta que informações sobre os tratamentos, avanços, conquistas e desafios na luta contra o câncer precisam ser sempre compartilhados. Munidas dessas informações, as comunidades médica e científica conseguem evoluir e cobrar respostas por parte do poder público.

“Acredito piamente que a informação científica não deve ter barreiras. Só evoluiremos se caminharmos juntos. O câncer atinge toda a população, de classes altas e baixas e de todos os níveis de renda. Precisamos trabalhar na ampliação do entendimento sobre esses avanços tão significativos para que eles não fiquem restritos a um círculo fechado de especialistas e sejam disponibilizados rapidamente à população. É preciso garantir acesso ao melhor tipo de tratamento para todos”, finaliza.

 

*Estagiária sob a supervisão de José Carlos Vieira

https://www.correiobraziliense.com.br/revista-do-correio/2021/01/4902721-novidades-em-tratamentos-oncologicos-aumentam-esperanca-de-pacientes.html

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Como a oncologia de precisão promove avanços no tratamento do câncer

 Terapias genéticas inovadoras prometem um cenário cada vez mais otimista na luta contra tumores malignos, mas ainda estão longe de significar a cura da doença. Entenda

·         MARÍLIA MARASCIULO

30 ABR 2020 - 13H27 ATUALIZADO EM 30 ABR 2020 - 13H27

 

Se o corpo humano fosse um castelo em guerra contra a invasão e disseminação de células cancerígenas, os tradicionais métodos de combate — a quimioterapia, a radioterapia ou a cirurgia — seriam o equivalente a uma bazuca: até conseguem eliminá-las, mas podem provocar danos irreparáveis à estrutura do castelo. Como se não bastasse, é difícil saber exatamente por onde os invasores tentarão entrar para ganhar o controle do castelo — enquanto a mira está na porta, pode ter outra tropa prestes a entrar pela janela.

Mas, nos últimos anos, um novo campo de estudo da medicina começou a mudar este cenário. Na chamada oncologia de precisão, desenvolvida a partir dos anos 2000, saem as bazucas e entram os snipers. A ideia é saber exatamente quando, como e onde atacar o tumor para ter os melhores resultados com os menores efeitos colaterais. Uma das estratégias mais promissoras é a das terapias genéticas. Como o nome sugere, elas miram nas mutações genéticas das células defeituosas para eliminá-las.

Para entender como os novos tratamentos funcionam, é preciso compreender o que é e como surgem os tumores malignos, ou câncer, termo que engloba um conjunto de mais de 100 doenças causadas pelo crescimento desordenado das células. Em nosso corpo, existem 10 trilhões delas, e no DNA de cada uma existem instruções de como devem crescer e se multiplicar.

Às vezes, pequenas mutações podem alterar essas ordens — em geral, o sistema imunológico consegue identificar as falhas e eliminá-las antes que se espalhem. Mas isso nem sempre acontece: nossa imunidade tem mecanismos para evitar reações exageradas que podem ser prejudiciais ao organismo. E o câncer se aproveita justamente disso, seja se escondendo dessas defesas, seja usando táticas para enganá-las e inibir um ataque. Assim, as células defeituosas se proliferam e replicam as informações erradas, crescendo desenfreadamente e invadindo os tecidos e órgãos.

 

A primeira geração dessas novas estratégias de combate ao câncer são as terapias-alvo. Trata-se de um ataque às moléculas essenciais para o funcionamento das células cancerígenas, freando sua expansão. A ideia é antiga: o bacteriologista alemão Paul Ehrlich, vencedor do Prêmio Nobel de Medicina em 1908, já havia sugerido naquela época a possibilidade de desenvolver um remédio que combatesse os mecanismos específicos de doenças infecciosas. Mas foi só a partir de 2000 que tais remédios se tornaram realidade — não para infecções, e sim na luta contra contra o câncer.

 

A ideia é atacar células específicas de tumores específicos. Por exemplo: existem diferentes tipos de mutações para câncer de mama, e a terapia foca em uma delas. Portanto, não serve para todos os pacientes. Por serem extremamente precisos, têm taxa de resposta alta e menos efeitos colaterais. O problema é que o tratamento depende de um “match” perfeito, e nem todo tumor tem o alvo ou a mutação específica para as quais os medicamentos funcionam.

 

Atualmente, existem terapias-alvo disponíveis para câncer de pulmão, tireóide, rim, pele, melanoma, sarcoma, fígado, cólon, reto, ovário, mama e leucemias e linfomas. No entanto, elas costumam ser mais recomendadas somente para esses três últimos tipos de câncer.

Quando o corpo é o melhor remédio
Um passo à frente da terapia-alvo, a imunoterapia usa nossas próprias células de defesa contra o câncer. É mais um método que, embora tenha evoluído só nos últimos cinco anos, vem sendo testado há pelo menos 100 anos.

 

Tudo começou no século 19, com o cirurgião americano William Coley. Ao observar que uma vítima de câncer se curou após uma grave infecção, ele desenvolveu a teoria de que, se super ativado, nosso sistema imunológico seria capaz de acabar com um tumor. O cirurgião chegou a fazer experimentos infectando propositalmente pacientes com câncer, sem sucesso.

Os anos passaram e os cientistas descobriram que a teoria de Coley não estava incorreta. Os maiores responsáveis por provar isso foram os imunologistas James P Allison, dos Estados Unidos, e Tasuku Honjo, do Japão, que venceram o Prêmio Nobel de Medicina em 2018 pela descoberta. Eles mostraram que é possível, sim, estimular o sistema imunológico para combater as células cancerígenas: basta bloquear o mecanismo utilizado por elas para enganar nossas defesas. Ele consiste na liberação de proteínas que se encaixam em receptores dos linfócitos T — o “cérebro dinâmico” do sistema imunológico e o responsável por reconhecer a célula danificada e emitir a ordem para que outras células a destruam — e bloqueiam o sinal de alerta.

 

Os remédios imunoterápicos atuam impedindo a liberação dessas proteínas ou obstruindo os receptores dos linfócitos T. Sem serem enganados, eles comandam o ataque. Apesar de também provocar efeitos colaterais, o método é menos agressivo e mais eficaz que os tratamentos tradicionais.

Super-heróis feitos sob medida
Dentro da imunoterapia, um método ainda mais moderno e inovador tem sido desenvolvido. O tratamento com as chamadas células CAR-T consiste na modificação genética em laboratório dos linfócitos T para que desenvolvam um receptor capaz de identificar as células tumorais. “Eles se transformam em super-heróis direcionados para o câncer”, exemplifica o oncologista Bernardo Garicochea, membro do Comitê de Oncogenômica da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC). Os linfócitos são então reinseridos no corpo do paciente para realizarem a missão.

 

Parece coisa de ficção científica, mas o tratamento já foi aprovado nos Estados Unidos para casos raros de câncer de sangue (linfomas e leucemia) resistentes aos métodos tradicionais. No fim de 2019, foi testado pela primeira vez na América Latina por pesquisadores brasileiros.

 

Feito na modalidade de tratamento compassivo, que permite o uso de terapias não aprovadas no país em casos graves sem outras opções disponíveis, o teste ampliou a expectativa de sobrevida de um paciente que sofria com linfoma não Hodgkin. Além disso, reduziu os sintomas clínicos e a necessidade de remédios para dor. E o método desenvolvido por aqui custa bem menos que o oferecido nos Estados Unidos — R$ 150 mil, em vez dos US$ 400 mil (mais de R$ 2 milhões) necessários por lá.

Entusiasmo cauteloso
O alto custo não é o único desafio para esses novos tipos de terapias, nem o mais difícil de se contornar: no Brasil, por exemplo, fica levemente acima do valor de um transplante de medula óssea (R$ 110 mil é o repasse do SUS). Há também a expectativa de que os preços diminuam à medida em que os tratamentos se tornem disponíveis para mais gente.

 

A parte mais complicada é identificar as mutações ou particularidades que possam ser usadas como alvos, na visão de especialistas. “São muitos passos até desvendar o quebra-cabeça de um tumor”, diz o oncologista Ramon Andrade de Mello, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e consultor científico da Escola Europeia de Oncologia.

Mello é o responsável por uma pesquisa para sequenciar o código genético dos tumores de pacientes não fumantes com câncer de pulmão. “Nós queremos identificar quais os genes mais responsáveis pelo câncer e, a partir disso, desenvolver medicamentos que inibam esses genes”, explica de Mello, que acredita que a pesquisa deve durar dez anos. O desafio é que os tumores no pulmão de pessoas que não fumam são minoria: entre os 1,5 milhão de casos de câncer de pulmão diagnosticados a cada ano no mundo apenas 15% se dão entre não fumantes.

 

Na explicação de Garicochea, para identificar todos os possíveis alvos, seria necessário um atlas do genoma humano e dos tumores para compará-los, e entender o que está errado. Uma tentativa neste sentido foi divulgada em fevereiro deste ano, na revista Nature. Durante uma década, 1,3 mil pesquisadores do consórcio Pan-Cancer Analysis of Whole Genomes, mais conhecido como Pan-Cancer, analisaram 2,6 mil tumores de 38 tipos de câncer. Eles mapearam o genoma destes tumores e apontaram quais falhas no DNA levaram ao desenvolvimento da doença.

 

Entre as descobertas que mais chamaram a atenção são as diferenças entre o câncer de um paciente e outro, e a interrelação entre os diferentes genes. “Existe comunicação cruzada dentro do próprio tumor, a chamada cross-talk, então às vezes quando você descobre como consertar uma pecinha [do quebra-cabeça], o danado vem e desmancha outra para atrapalhar”, diz o oncologista da Unifesp.

 

Esses são alguns dos motivos pelos quais os cientistas são receosos em anunciar as terapias como potenciais curas para o câncer. “Elas não são a salvação da pátria, são mais um passo dessa caminhada, vão falhar em muitos pacientes, vão curar algumas vidas, nós vamos aprender a melhorá-las e aprender muitas coisas com elas”, diz Garicochea.

Mesmo assim, elas entusiasmam não só pelo potencial de tratamento, mas por também incentivarem avanço nas pesquisas que trazem descobertas importantes também para a prevenção. O especialista da Unifesp não esconde o otimismo: “estamos em uma nova era, o câncer está cada vez mais se tornando uma doença crônica quando bem abordado. Em 2040 talvez o câncer seja tratado como hoje é o diabetes.”

https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/Saude/noticia/2020/04/como-oncologia-de-precisao-promove-avancos-no-tratamento-do-cancer.html

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

'Em 15 ou 20 anos, o câncer deverá ser uma doença controlada, como a Aids', diz pesquisador do Inca



Câncer é a doença que mais amedronta brasileiros; ela surge de mutações genéticas que transformam células em tumores (Foto: Pixabay/Creative Commons/Qimono)

Especialista em imunoterapia, um dos tratamentos mais avançados contra os tumores, João Viola fala sobre a evolução nas descobertas sobre a doença mais temida pelos brasileiros.

Por BBC
11/12/2017 08h29  Atualizado há 1 hora

Nas décadas de 1980 e 1990, um mal pouco conhecido passou a assombrar o mundo e intrigar os cientistas: a Aids, causada pelo vírus HIV. Altamente letal à época, a nova doença se tornou um pesadelo. O filósofo Michel Focault, o ator Rock Hudson, o cantor brasileiro Cazuza e o lendário roqueiro Freddie Mercury foram apenas algumas das celebridades que morreram em decorrência dela.
Mas três décadas depois do surto inicial, as perspectivas de vida de um portador do vírus do HIV são bem diferentes das daqueles tempos. A eficiência dos coquetéis antirretrovirais é comprovada pelos números - no Brasil, o índice de mortalidade caiu mais de 42% nos últimos 20 anos, e a epidemia é considerada estabilizada. Hoje, a doença que mais assusta os brasileiros não é mais a Aids - e sim o câncer.
Segundo pesquisa do instituto Datafolha, esse é o diagnóstico que 76% das pessoas mais temem ouvir - é visto por elas praticamente como uma "sentença de morte". Só entre o ano passado e o atual, a estimativa era de que 600 mil novos casos surgissem no Brasil.
Mas diferentemente do senso comum, os tratamentos já evoluíram bastante, a ponto de João Viola, pesquisador do Inca (Instituto Nacional do Câncer) desde 1998 e chefe da divisão de pesquisa experimental e translacional do órgão, dizer que "a grande maioria dos cânceres são curáveis". "Hoje a gente tem capacidade de curar doentes. Esse estigma, a gente tem que combater", afirma em entrevista à BBC Brasil.
Por outro lado, ressalta ser difícil poder falar em "cura definitiva" quando se trata da doença, já que ela pode ser extinta em um órgão e voltar em outro. Até por isso, os cientistas trabalham para torná-la "controlável" - assim como é a infecção pelo HIV hoje.
"É muito difícil falar em cura porque, uma vez que você tem, precisa estar sempre em vigilância. Mas o que a gente está prevendo é que, em 15 ou 20 anos, o câncer vai ser a mesma coisa que a Aids. O paciente fica em tratamento-controle por muito tempo, e aí vira uma doença crônica. Isso é bem plausível, bem possível."
Leia os principais trechos da entrevista, na qual Viola fala sobre a evolução no tratamento da doença e as perspectivas sobre seu futuro.

BBC Brasil - Quando falamos em câncer, ainda há um estigma forte e uma ideia de que a doença é uma "sentença de morte", mais ou menos como era a Aids na década de 1980. Hoje, a Aids não foi erradicada, mas consegue ser bem controlada com remédios. O que evoluiu de lá para cá no caso do câncer?
João Viola - Existe uma correlação de desenvolvimento muito semelhante com a Aids, hoje a gente discute o câncer mais ou menos desse jeito. Mas é importante ressaltar que, quando a gente fala em Aids, a gente está falando em uma doença. Quando a gente fala em câncer, a gente está falando em mais de cem doenças diferentes. Há alguns mais agressivos, menos agressivos, mas é uma abrangência de diferentes tipos.
O ponto importante é: a grande maioria dos tumores hoje são curáveis. Desde que sejam identificados mais precocemente. Se a gente consegue identificar o tumor bem precoce, há intervenções com as quais conseguimos curar o paciente.

BBC Brasil - O câncer engloba várias doenças, mas o mecanismo de ação é o mesmo em todas elas, certo? Uma célula ruim que se multiplica e vai afetando um órgão. Por que, então, é tão difícil inibir esse mecanismo que forma os tumores malignos?
João Viola - O câncer é uma doença basicamente genética. Nosso genoma é a informação genética que nós temos, então o câncer tem uma base genética e ele parte de mutações no nosso genoma que alteram a fisiologia daquela célula. Uma célula, como qualquer ser vivo, nasce, divide, diferencia e morre. Toda célula tem que fazer isso. O câncer é uma doença genética que altera essa relação da fisiologia celular, e essa célula passa a se dividir desreguladamente e não morre.
Há um conjunto de genes chamados oncogenes que, quando estão no seu funcionamento normal, são fundamentais para nós. Mas se ele passa por uma mutação que o faz se desregular, isso altera a vida celular. Só que são milhares de genes. A gente já conhece algumas dessas alterações, mas elas são muitas, e relacionadas a diferentes tipos tumorais.
São doenças muito diferentes que podem ter estágios diferentes, e que são causadas por mutações em genes diferentes. O tumor X pode estar mais relacionado ao oncogene Y e por aí vai. Mas o mecanismo é o mesmo: em algum órgão seu, uma célula mutou para uma célula tumoral.
E aí tem uma coisa que a gente chama de microambiente tumoral. Quando a gente tem um tumor que está crescendo, ele altera o ambiente onde está, onde as outras células vivem. Os tumores malignos, além de crescerem naquele local, as células dele saem daquele tumor, pegam a corrente sanguínea e crescem em outros tecidos - que são as metástases. Então retirar o tumor não necessariamente retira o problema.

BBC Brasil - O senhor se formou no final da década de 1980, quando o câncer ainda era pouco conhecido. Um paciente que se descobria com a doença naquela época tinha quais tipos de tratamento disponíveis?
João Viola - O primeiro tratamento que se tem é a cirurgia. Até hoje, a primeira coisa que se faz é tentar retirar esse tumor. Então até que os primeiros quimioterápicos surgissem, era só cirurgia. Mas a probabilidade de curar assim era muito pequena, não vai resolver por causa dos tumores secundários que surgem.
No final da década de 1970, começam a surgir as primeiras químios, as primeiras drogas quimioterápicas que aparecem e que basicamente inibem a divisão celular, ou seja, inibe que aquela célula (tumoral) se divida muito. Só que são drogas completamente inespecíficas. Elas não inibem só a divisão das células tumorais, inibem a divisão das células normais também. Quais são as células nossas que dividem muito? Cabelo, pele, intestino - por isso que as pessoas que passam por químio têm problemas intestinais e perdem cabelo.
Então o que você fazia? Retirava o tumor por cirurgia e tratava por quimioterapia tentando matar aquelas células tumorais que você não sabe onde está. Junto com isso surge também a radioterapia, no século 20. Você tenta matar essas células também por radiação. Esse era o tripé do tratamento.

BBC Brasil - E hoje, três décadas depois, o que há de novidade nos tratamentos?
João Viola - No final do século 20 e início do 21: dois grandes grupos de drogas começam a ser importantíssimos e começam a mudar a perspectiva de vida dos pacientes, junto com as outras.
Uma delas é a terapia-alvo. Você começa a conhecer melhor a biologia do tumor e consegue entender qual é o gene que faz o tumor X, Y, Z, quais são as mutações, e isso é muito importante. No final do século 20, a gente teve o genoma humano mapeado, e aí a gente conhece todos os genes humanos e sabe qual é a estrutura do gene normal.
Sabendo isso, a gente começa a trabalhar em cima do câncer e entender: o gene X está mutado na doença A. E começa a correlacionar os genes e as doenças: esse gene é importante para desenvolver o tumor de mama, esse para o tumor cerebral e por aí vai. Aí começamos a desenvolver drogas que agem especificamente nessas vias que estamos falando, para interferir no gene X, Y ou Z.
Isso é o que a gente chama de terapias-alvo. Se a gente sabe que há tal mutação, a gente vai trabalhar para bloquear essa mutação para se aproximar da cura. As terapias-alvo são um passo à frente da quimioterapia. Porque na quimio você vai lá e mata tudo, a terapia-alvo consegue ir naquele alvo específico.
Uma das possibilidades que a gente tem, além de fazer todos esses tratamentos, é ativar o nosso próprio sistema imune para destruir o câncer, destruir a célula tumoral. Porque temos uma resposta imunológica no organismo contra ela, só que, por diversas razões, o tumor consegue escapar. Mas aí conseguimos modular esse escape e fazer com que as células do sistema imune combatam esse tumor. Essas são as imunoterapias.
Agora uma coisa importante é o custo. Essas terapias não tiram as originais. O paciente continua sendo operado, continua usando químio, radioterapia e mais essas duas outras terapias. O que faz com que hoje o tratamento seja extremamente caro. Teremos que trabalhar isso, mas é um tratamento que está dando muito certo.

BBC Brasil - Se é possível fazer com que o próprio organismo produza os anticorpos para combater as células tumorais, isso significaria uma possível cura definitiva do câncer?
João Viola - Não necessariamente, porque essa resposta autoimune também pode ter consequências ruins. Veja, a maior revolução mesmo contra o câncer que temos hoje é uma outra coisa, os bloqueadores do ponto de checagem imunológico.
Isso funciona assim: tudo em nosso organismo tem algo que acelera e tem um freio, como em qualquer lugar. Para balancear. A resposta imune é a mesma coisa. Há um ponto de checagem em que identificamos que essa célula, por exemplo, é tumoral - aí vem o linfócito e vai tentar matar. Esse linfócito reconhece inicialmente o problema e libera o anticorpo contra ele, mas depois o linfócito passa a ter na sua membrana umas moléculas que vão fazer um freio na resposta imune. Ela freia a resposta imune. Porque você ter uma reposta autoimune exagerada também vai causar doença - por exemplo, as doenças autoimunes.
O tumor é feito pela gente, diferente de uma infecção viral ou de bactéria, que vem de fora. Então a resposta antitumoral é uma resposta que está na gente, ou seja, autoimune, a princípio. Então como qualquer resposta autoimune, o nosso organismo freia essa resposta. Porque indivíduos que apresentam problemas nesse freio têm doenças autoimunes. Há muitas: lúpus, artrite reumatoide....
O que se viu? É que no câncer, se eu venho aqui e bloqueio essa via negativa que freia os linfócitos, eu aumento a resposta antitumoral. Se eu posso ativar a resposta autoimune contra um tumor, também posso bloquear o bloqueador da resposta, que são essas moléculas. E aí o organismo consegue continuar multiplicando os anticorpos e os linfócitos conseguem combater e matar o tumor.

BBC Brasil - O câncer tem esse aspecto de ir e voltar. É possível hoje falar em cura real do câncer?
João Viola - É muito difícil falar em cura, porque uma vez você que tem, precisa estar sempre em vigilância. Você só cura se, depois de 20 anos, não apareceu mais nada. Só posso falar em cura se ela for definitiva. A gente sempre fala que o câncer pode recorrer, sim.
Eu vi a Aids aparecer, depois vi os tratamentos. Então saí da faculdade, e ela não tinha cura. Um paciente que tinha diagnóstico de Aids, isso era uma sentença de morte. Um, dois anos de vida, seis meses. Mas mudou absolutamente, essa terapia tripla que se faz atualmente é uma coisa fantástica. Eu tenho amigos que são HIV positivo, não têm Aids e estão no tratamento há 15 anos.
Mas vira uma doença crônica. É a mesma coisa que estamos falando da diabetes, vai ter que controlar o resto da vida. Hipertensão se trata para o resto da vida. Mas se fizer direitinho, está controlado. Mas não está curado. A Aids, a mesma coisa.

O que estamos prevendo é que, possivelmente, em alguns anos o câncer vai ser assim. É possível que daqui a pouco a gente tenha tratamento e que o paciente fique em tratamento-controle por muito tempo, que vire uma doença crônica. Continue mais ou menos na correlação da Aids.

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Sem prevenção, câncer será maior causa de mortes no Brasil em 2029

Se não houver melhora nas políticas públicas, a mortalidade pela doença será maior do que por problemas cardiovasculares

Por: Estadão Conteúdo
15/08/2016 - 11h06min | Atualizada em 15/08/2016 - 11h06min

Se as políticas públicas de prevenção, detecção e tratamento do câncer não forem aprimoradas, a doença se tornará, em 2029, a principal causa de mortalidade no Brasil, superando as doenças cardiovasculares, como infarto e AVC. Essa é a conclusão de um estudo feito pelo Observatório de Oncologia, plataforma de análise de dados criada pelo movimento Todos Juntos Contra o Câncer, liderado pela Associação Brasileira de Leucemia e Linfoma (Abrale).
Com base nas taxas de mortalidade por câncer e problemas cardiovasculares do período entre 2000 e 2013 e nos dados de projeção da população do Instituto Brasileiros de Geografia e Estatística (IBGE), os pesquisadores fizeram uma estimativa do número de óbitos pelos dois grupos de doenças.
— Observamos que a curva de crescimento das mortes por câncer estava mais inclinada do que a das doenças cardiovasculares e isso indica que, provavelmente, em algum momento, elas vão se cruzar. Fizemos análise preditiva do período até 2040 e chegamos ao dado de que, em 2029, o câncer passará a ser a maior causa de mortalidade — explica Hellen Matarazzo, gerente de ensino e pesquisa da Abrale.

De acordo com a estimativa, naquele ano, a taxa de mortalidade por tumores será de 115 por 100 mil habitantes, enquanto o índice de óbitos por doenças cardiovasculares será de 113 por 100 mil habitantes. Hoje, o câncer é responsável por 106,3 mortes por 100 mil brasileiros e os problemas do aparelho circulatório, por 168,9 óbitos por 100 mil. Juntas, as duas doenças matam por ano cerca de 542 mil pessoas no País, segundo dados mais recentes do Datasus.
Diferenças
Embora o câncer possa se tornar a maior causa de óbitos num futuro próximo, a incidência e mortalidade pela doença será extremamente diversa de acordo com o tipo de tumor, o sexo e a região do País. Alguns cânceres provocarão menos mortes, enquanto outros farão muito mais vítimas.
Segundo o estudo, entre as mulheres, a mortalidade por câncer de mama deverá se manter estável no Sul e Sudeste, onde os serviços de detecção e tratamento estão mais bem estruturados, e aumentará nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Pela mesma razão, os óbitos por câncer de colo de útero deverão cair nas duas regiões mais ricas do País e continuar crescendo ou ficar estável nas demais.
— Todo esse cenário pode mudar se as políticas públicas forem eficientes. Desde 2014, por exemplo, temos a vacinação de meninas contra o HPV, o que previne o câncer de colo de útero. Se isso for implementado com sucesso, as mortes por esse tipo de tumor vão cair em todo o País. E é isso que a gente quer, que nossos dados se mostrem errados porque a política interveio antes — diz Hellen.
Outra má notícia para as mulheres é que as mortes por câncer de pulmão aumentarão em todas as regiões.
— As mulheres adotaram o hábito de fumar muitos anos depois dos homens e isso terá reflexo na incidência de câncer daqui a algum tempo. Como eles fumam mais e há mais tempo, acabaram sendo mais impactados pelas propagandas antifumo — diz o oncologista Fernando Cotait Maluf, fundador do Instituto Vencer o Câncer e chefe da oncologia clínica do centro oncológico Antonio Ermírio de Moraes.
Entre os homens, as mortes por câncer de próstata cairão no Sul e Sudeste e aumentarão nas outras regiões. O mesmo ocorrerá com o câncer de pulmão. Os tumores de intestino deverão crescer em ambos os sexos e em todo o país. 
— Abandonar o cigarro, evitar o álcool de maneira excessiva, combater a obesidade desde a infância, tudo isso ajudaria a reduzir o número de casos de câncer em 30% a 40% — diz Maluf.
*Estadão Conteúdo

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Microsoft assume responsabilidade e diz que descobrirá cura do câncer em dez anos



Microsoft ultimamente anda assumindo grandes responsabilidades. Após anunciar o investimento em jovens brasileiros, a companhia de Redmond acaba de fazer mais uma grande promessa para o futuro: descobrir a cura do câncer nos próximos dez anos. Pode parecer um pouco estranho, mesmo com a companhia aplicando dinheiro em projetos inovadores através da Fundação Bill e Melinda Gates, mas a mesma pretende chegar a essa incrível conquista, assim como a cura da AIDS, utilizando do seu vasto conhecimento e experiência em computadores

A resposta para isso é um tanto quanto simples e a Microsoft pretende tratar as células cancerígenas como se fossem vírus de computador, monitorando as replicações e tentando reprogramar o material genético. Para isso, a gigante de Redmond está desenvolvendo uma unidade de "computação biológica", em que as células poderiam habitar o ambiente orgânico e computacional, auxiliando o trabalho dos pesquisadores. O prazo fixado para isso é de, no máximo,

O campo da biologia e o da computação parecem ser como a faca e o queijo. Os processos complexos que ocorrem nas células tem alguma similaridade com aqueles que acometem um computador de mesa comum", avalia Chris Bishop, chefe de pesquisa do laboratório da Microsoft em Cambridge, Reino Unido.

Dessa forma, além de provar - mais uma vez - que a tecnologia é uma grande aliada da medicina, a Microsoft e sua equipe se consagrariam por toda a história não só por seu legado na era dos computadores dez anos. Como também da biologia, além, é claro, em uma visão mais otimista e sem pensar nos lucros que pode obter com isso, transformar a vida de muitas pessoas.


MICROSOFT QUER ‘RESOLVER’ O CÂNCER DENTRO DE DEZ ANOS
|Publicado em: 20 de setembro de 2016
PROJETO TRATA TUMOR COMO VÍRUS DE COMPUTADOR, COM INTUITO DE REPROGRAMAR DOENÇA

RIO — A Microsoft pretende “resolver” o câncer dentro de dez anos. A companhia, conhecida por sua atuação na indústria de softwares, está trabalhando para tratar a doença como um vírus de computador, que invade e corrompe as células do corpo. Dessa forma, a expectativa é que no futuro próximo seja possível monitorar essas células e, potencialmente, reprogramá-las para que elas se tornem saudáveis novamente.

Para isso, a empresa construiu uma unidade de Computação Biológica, com o objetivo final de transformar células em computadores vivos. Dessa forma, elas seriam capazes de serem programadas e reprogramadas para tratar praticamente qualquer doença. No curto prazo, a companhia pretende utilizar a inteligência artificial para encontrar uma cura para o câncer, no projeto batizado como Hanover.

De acordo com a companhia, uma máquina de aprendizagem será abastecida com os milhares de estudos que são publicados em periódicos científicos para ajudar médicos e pacientes a personalizar tratamentos para a doença. O arquiteto do Hanover, Hoifung Poon, está trabalhando com pesquisadores do Knight Cancer Institute, da Universidade do Oregon, para que o sistema descubra combinações de drogas efetivas no combate da leucemia mielogênica aguda, um tipo quase sempre fatal de câncer que não teve grandes avanços em tratamentos nas últimas décadas.

O câncer é causado por mutações genéticas que fazem com que as células cresçam e se multipliquem sem controle. A possibilidade de encontrar essas mutações específicas levaram ao surgimento de novas drogas, que atacam a doença de forma mais precisa, aumentando as taxas de sobrivivência. De acordo com relatório da organização Pharmaceutical Research and Manufacturers of America, existem mais de 800 medicamentos e vacinas em testes clínicos contra o câncer.

— É excitante, mas também nos fornece um desfio de como lidar com tantos dados — disse Jeff Tyner, diretor do Knight Institute, à Bloomberg. — É por isso que a ideia de um biólogo trabalhar com cientistas da informação é tão importante. A combinação de todos esses recursos vai ajudar a tornar os mais recentes avanços em terapias mais efetivas e menos tóxicas.

PROCESSOS SIMILARES AOS DE COMPUTADORES
Aparentemente, os campos da biologia, matemática e computação são distintos, mas as barreiras que as separam estão sendo quebradas nos últimos anos.

— Os processos complexos que acontecem nas células possuem alguma similaridade com aqueles que acontecem em um computador desktop padrão — disse Chris Bishop, diretor do laboratório da Microsoft Research em Cambridge, à revista “Fast Company”.

Dessa forma, esses processos complexos também podem, potencialmente, serem compreendidos por um computador desktop. E esses mesmos computadores podem ser usados para compreender como as células se comportam para tratá-las quando necessário. Se isso for possível, os computadores não apenas entenderão os motivos das células se comportarem de determinada maneira quando se tornam cancerígenas, mas também poderão disparar uma resposta dentro da célula, para reverter essa programação.

Andrew Philips, que lidera a unidade de Computação Biológica, afirmou ao “Telegraph” que em cerca de 5 anos um sistema para detectar problemas nas células estará pronto.

— É um prazo longo, mas eu penso que será tecnicamente possível dentro de 5 a 10 anos criar um sistema molecular inteligente que seja capaz de detectar doenças — disse Philips.

Os pesquisadores já desenvolveram um software que simula o comportamento sadio de uma célula, batizado como Bio Model Analyser, que pode ser comparado com o de uma célula doente para pesquisar onde o problema ocorreu e como pode ser consertado.

— Se nós formos capazes de controlar e regular o câncer, ele se tornará como qualquer doença crônica, e o problema estará solucionado — disse Jasmin Fisher, pesquisador da Universidade Cambridge. — Eu acredito que para alguns tipos de câncer, o prazo é de cinco anos, mas definitivamente dentro de uma década. Então, teremos provavelmente um século livre do câncer.