sexta-feira, 13 de maio de 2016

A forma como células do câncer se espalham é mais assustadora do que se pensava


Por: Jennifer Ouellette
19 de abril de 2016 às 10:58

As células do câncer têm uma maneira aterrorizante e engenhosa de passar até mesmo através dos menores vasos sanguíneos e se espalhar por todo o corpo humano, de acordo com um novo estudo realizado por pesquisadores do Massachusetts General Hospital (MGH). Descobrir como impedi-las de fazer isso pode ajudar a conter esta doença mortal.

O câncer se espalha por todo o corpo – em um processo conhecido como metástase – quando determinadas células se rompem do tumor primário e entram na corrente sanguínea. A metástase está associada à maior parte (90%) das mortes relacionadas ao câncer.
Cientistas achavam que os aglomerados dessas células eram grandes demais para passar através de vasos capilares ultrafinos. Os pesquisadores do MGH descobriram que este não é o caso.
Esta é a parte aterrorizante: os aglomerados podem se reorganizar no formato de um fio, como esferas encadeadas, quando se deparam com um gargalo. Depois de passarem por vasos finos, as células simplesmente retomam o formato de aglomerado. A equipe publicou as descobertas no Proceedings of the National Academy of Sciences.

“Esta informação muda a narrativa padrão de como a metástase [começa], e nos permite desenvolver formas melhores de combatê-la”, diz o autor Sam Au em um comunicado.

De acordo com Au, este comportamento estranho parece estar ligado à interação entre as células de câncer no aglomerado. Células interagem umas com as outras o tempo todo; neste caso, as ligações são tão fortes que o aglomerado pode facilmente se reconfigurar, sem danificar as células individuais ou impedi-las de se proliferar no futuro.
Separando os aglomerados
Os cientistas já suspeitavam que os aglomerados de “células tumorais circulantes” (CTCs) têm papel fundamental na propagação do câncer. Por exemplo, estudos anteriores mostraram a presença de aglomerados bem grandes nas veias dos braços de pacientes falecidos, longe do local do tumor original.
Isso significa que os aglomerados devem ter passado até mesmo pelos menores vasos sanguíneos, conhecidos como capilares. Mas os cientistas não tinham ideia de como os aglomerados – muito maiores do que esses vasos – conseguiam esse feito.
O motivo: essas células são muito raras, e é extremamente difícil separá-las dos bilhões de outras células flutuando na corrente sanguínea. É o velho problema da agulha no palheiro, dificultando estudá-las de perto.
Para separar os aglomerados, a equipe do MGH contou com avanços recentes na microfluídica, área da ciência que lida com o comportamento de fluidos em canais microscópicos. Ela permite criar “laboratórios em um chip” que podem processar rapidamente grandes volumes de sangue.
Com estes chips microfluídicos, é possível identificar aglomerados de câncer através de um processo chamado de “esgotamento negativo”. Você remove sucessivamente 999 bilhões de células, depois 999 milhões de células, depois 999 mil células, e assim por diante, até chegar ao um punhado de células tumorais.
Estudo
No ano passado, o coautor Mehmet Toner usou um chip desses para determinar que os aglomerados eram mais comuns na corrente sanguínea do que se acreditava anteriormente.
Para o estudo mais recente, a equipe usou duas abordagens. Primeiro, eles gravaram canais no chip que se afunilam em pontos-chave, formando gargalos mais ou menos com a mesma largura de vasos capilares. Em seguida, eles filmaram o movimento dos aglomerados de CTC dentro desses canais:
Em segundo lugar, a equipe do hospital injetou aglomerados de células humanas de câncer nos vasos sanguíneos de peixes-zebra embrionários. Eles foram escolhidos porque seus vasos transparentes facilitam a obtenção de imagens, e também porque têm vasos aproximadamente do mesmo tamanho de capilares humanos.
Em ambos os casos, os aglomerados simplesmente se desdobraram em uma cadeia longa para passar através do gargalo, e depois se reorganizaram em um aglomerado de novo. Isto acontecia mesmo com grandes grupos com mais de 20 CTCs.
A boa notícia: isto fornece uma pista para possivelmente limitar a sua propagação. “Se nós pudermos mudar essa força entre as células, seja quebrando aglomerados ou impedindo-os de se desdobrar, poderíamos controlar a sua capacidade de passar por vasos estreitos”, diz Au.

quarta-feira, 4 de maio de 2016

'É preciso aprender a falar sobre câncer', diz criador de ONG que ajuda pacientes

 (...) Depoimento a 
MICHELLE HEYMANN 
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM TEL AVIV
Benjamin Corn, 55, moldou sua vida ao redor do câncer depois que o pai foi vítima da doença quando ele tinha 11 anos. Decidiu ser oncologista e criou a ONG Life's Door para ajudar pacientes com câncer e seus familiares.
Quando eu tinha 11 anos, minha vida mudou. Meu pai morreu de câncer de próstata e foi muito traumático para mim. Era a década de 70 e meus pais esconderam a doença. Diziam que ele estava em viagens de trabalho toda vez que ia ao hospital.
Ele ficou doente por cerca de dois anos. Mais ou menos uma semana antes do fim, eles perceberam que a morte estava próxima e sabiam que tinham que contar para mim e meus irmãos.
Meu pai sempre foi um homem atlético, mas quando o vi no hospital, estava desfigurado. Seus braços e pernas pareciam palitos frágeis, porque ele perdeu muito peso.
Recebemos a notícia durante o Pessach, a páscoa judaica. O telefone começou a tocar sem parar no meio do jantar e já sabíamos que era o hospital ligando para falar que meu pai morrera.
Minha mãe atendeu e lhe disseram: "Senhora Corn, seu marido faleceu, podemos fazer a necropsia?". Foi tudo o que falaram. Só queriam saber se podiam remover os órgãos para os patologistas analisarem. Foi extremamente traumático. Eu me senti abandonado.
Não sabíamos o que fazer. Meu pai teve um tratamento excelente no Hospital Memorial Sloan, mas lá ninguém sabia como se relacionar com ele emocionalmente.
Ninguém sabia o que fazer, porque não se falava de câncer. Até hoje não se fala muito de câncer. Vivemos em uma sociedade onde não se fala de doenças. Nos filmes e novelas, todos são saudáveis e criamos uma expectativa de que precisamos ser assim. É um tabu na nossa sociedade.
Então, aos 11 anos, pensei: isso precisa ser consertado. Eu achava que o problema era só o câncer. Então, decidi virar um médico especialista em câncer de próstata.
Fui para a faculdade de medicina da Universidade de Boston, fiz residência na Universidade da Pensilvânia e fui treinado para ser um oncologista. Comecei a publicar e fazer pesquisas na área. Até que percebi que o problema não era o câncer, mas as pessoas. O que me interessava era por que os pacientes eram tratados com frieza e distância.
Temos que moldar nosso discurso para a nossa audiência. Não se deve falar com um paciente como se fala com outros médicos. Mas a maioria dos médicos não entende a necessidade dessa adaptação de discurso. Precisamos ajustar o tom, as palavras que usamos. E é preciso escutar.
Ninguém quer estar no departamento de oncologia. Mas estão aqui. E estão assustados. Então temos que ajudar. No hospital, mantemos um ambiente aconchegante e temos que ser sensíveis. O paciente precisa saber que temos o conhecimento de como tratá-lo, mas precisa também saber que nos preocupamos com ele, porque ele tem medo. Medo de morrer, da dor e de ser abandonado.
Eu acho que o modo de solucionar o medo dos pacientes é criando esperança. Quando eu digo esperança, não é para a cura. É para ajuda-los a superar seus medos, pensando em como atingir metas que eles criaram para a vida.
Eu até diria que a esperança é uma emoção muito mais humana que o amor. O amor dá para encontrar no mundo animal, ao ver como eles se relacionam. A esperança requer que pensemos sobre o futuro. E só humanos conseguem pensar adiante, planejar o futuro.
Logo depois que viemos para Israel, eu e minha mulher, Dvora, -que é terapeuta familiar- criamos o Life's Door. O objetivo da ONG é discutir com todos do círculo social do paciente como acrescentar significado à vida deles e à dos doentes.
Se as pessoas fossem treinadas para conversar em 1972, a primeira coisa que teriam me ensinado seria que não há motivo para a vergonha, porque eu não fiz nada de errado. Mas eu era envergonhado e fechado. Eu fazia de conta que nada tinha acontecido, meus amigos faziam de conta que nada tinha acontecido, e não falávamos sobre isso. O maior problema ainda é que ficamos desconfortáveis com essa notícia e não se fala sobre câncer.