04 de julho de 2012 • 15h01 • atualizado às 16h48
O chip usa amostras de sangue do paciente para achar células raras, como as tumorais circulantes (CTCs)
Matheus Pessel
Pesquisadores do Hospital Geral de Massachusetts (ligado à Universidade de Harvard, nos Estados Unidos) afirmam ter criado um método de identificar com precisão no sangue a presença de células consideradas raras, inclusive de um tipo que teria papel-chave na metástase de tumores.
Nos últimos 15 anos, foram desenvolvidos diversos exames para detectar essas células, mas eles são caros e complicados. O novo método simplificaria o processo e poderia ser usado até em clínicas. A pesquisa foi divulgada nesta quarta-feira em artigo na revista especializada Science Translational Medicine, da Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS, na sigla em inglês, que também publica a Science).
Os métodos atuais de detecção de células raras - como as tronco, as endoteliais, do sistema imunológico, e as chamadas tumorais circulantes (CTC) - não é simples, afinal, estima-se que exista uma dessas para cada bilhão de células sanguíneas, ou 1 ml do sangue. O processo atual envolve purificação da amostra, o que leva à perda delas e dos seus biomarcadores.
Os pesquisadores de Harvard conseguiram fazer essa detecção de maneira mais eficiente, simples e barata. Eles usam nanopartículas magnéticas para "etiquetar" essas células e identificá-las ao passar uma amostra de sangue por um sensor de efeito Hall (que registra mudanças em um campo magnético) em miniatura, literalmente um chip. Essas partículas se prendem a biomarcadores específicos que existem na superfície da célula. Em 20 pacientes com tumor no ovário, eles conseguiram identificar três desses marcadores relacionados com o câncer.
Chamado de micro detector Hall (mHD) ele consegue descobrir rápida e quantitativamente as CTCs e sem a necessidade de purificação. A pequena máquina utiliza um chip e elimina a necessidade de equipamentos caros, como centrífugas, o que facilita o uso em clínicas.
"A plataforma do mHD é muito versátil. Os marcadores de interesse são facilmente intercambiáveis. Isso nos permite personalizar um painel de marcadores para cada (tipo de) câncer", diz ao Terra o professor de Harvard Cesar Castro, um dos autores do artigo e criadores do equipamento.
Segundo os pesquisadores, o novo equipamento pode ser utilizado para diagnosticar e prognosticar a doença, além de monitorar a progressão do câncer. Para testar o terceiro uso, os cientistas aplicaram a substância geldanamycin (que não é usada em tratamentos, pois causa danos ao fígado) em ratos com câncer. Aqueles que receberam a droga demonstraram queda no fator de crescimento - detectada pela queda em um dos biomarcadores registrados pelo mHD. Os animais que não receberam não tiveram mudanças nesse marcador.
O artigo afirma que outra vantagem do método do mHD é que, ao usar um sensor de efeito Hall ao invés de magnetorresistência, ele permite a fabricação de equipamentos muito mais simples e baratos. Os autores (oito pesquisadores, no total) explicam que os detectores Hall são amplamente utilizados pela indústria e aparecem em equipamentos tão diferentes como odômetros de carros e aparelhos de GPS. "Um cálculo (de custo) aproximado seria de aproximadamente US$ 10 por chip descartável", diz Castro.
Os cientistas compararam os testes em pacientes com outro método - chamado comercialmente de CellSearch. Enquanto o processo "antigo" descobriu uma célula em 7,5 ml de sangue em média, o novo encontrou uma média de 57 em amostras iguais. A precisão é de 96%, afirma o artigo.
As CTCs e o câncer
Em um artigo separado da revista, os pesquisadores Joshua M. Lang, Benjamin P. Casavant e David J. Beebe (todos da Universidade do Wisconsin e que não tiveram relação com o estudo de Harvard) comentam o desenvolvimento do aparelho e dizem que ele pode ajudar a responder uma pergunta corrente na medicina nos últimos anos: as CTCs aumentam a chance de metástase e de retorno do tumor ou não tem relação com isso?
Em um artigo separado da revista, os pesquisadores Joshua M. Lang, Benjamin P. Casavant e David J. Beebe (todos da Universidade do Wisconsin e que não tiveram relação com o estudo de Harvard) comentam o desenvolvimento do aparelho e dizem que ele pode ajudar a responder uma pergunta corrente na medicina nos últimos anos: as CTCs aumentam a chance de metástase e de retorno do tumor ou não tem relação com isso?
"A enumeração da massa de CTCs de pacientes em estágio avançado de câncer ainda vai responder se essas células isoladas são responsáveis por iniciar metástase em um lugar, são células em trânsito de lugares de metástase já estabelecidos, ou simplesmente células com pouca relevância para a progressão do câncer", dizem os pesquisadores no artigo.
Contudo, segundo os cientistas, a grande esperança na pesquisa sobre os CTCs é que eles possam ser usados como simples e acessíveis biomarcadores, o que nenhum exame atual do tipo - como o CellSearch, por exemplo - consegue fazer. Mas o mHD poderia mudar esse quadro e isso ajudaria os médicos a monitorar e decidir qual é o melhor tratamento para cada paciente que sofre da doença e seria uma grande vantagem sobre exames de imagem e as dolorosas biópsias, já que leva a um resultado em um período de tempo muito mais curto.
Castro afirma que, para a oncologia, o equipamento poderá ser usado tanto para o tratamento como para a pesquisa. "A capacidade de examinar as células cancerosas no sangue utilizando um método barato e fácil de usar, permitiria a os cientistas de todo o mundo perseguir suas hipóteses principais (de pesquisa) em seus próprios laboratórios ou clínicas", diz o cientista. "Pelo menos, é possível que (o mHD) nos permita examinar o sangue de cada paciente e, se for encontrado (células de) câncer, permitirá aos oncologistas seguir imediatamente a quimioterapia sem os atrações de complicações de uma cirurgia (no caso, a biópsia)."
Os editores da revista dizem que o equipamento permite finalmente encontrar a agulha no palheiro e comemoram a criação. "O mHD parece ser o contador de células mais sensível que existe, com potencial para mudar o manejo de pacientes e o monitoramento da doença em clínicas. As agulhas ainda estão lá, mas nós temos agora uma rápida maneira de apartá-las do palheiro", afirmam em nota.
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