domingo, 12 de fevereiro de 2017

Sentia meu corpo morrer durante a químio

Sabrina Parlatore, 42, ex-VJ da MTV, superou o câncer de mama e dá palestras sobre o assunto

27 jan 2017, 20h00

Uma noite de 2015, eu estava assistindo à televisão e, distraída, passei a mão no colo. Senti uma bolinha no meu peito, que não doía, mas fui dormir preocupada. Na manhã seguinte, liguei para minha médica, que me pediu exames e me encaminhou ao mastologista. De cara, ele me disse que as chances de ser câncer eram 40%, mas precisávamos esperar o resultado da biópsia. Tentei me acostumar com a ideia, mas a verdade é que nunca estamos preparados para um diagnóstico de câncer.
Seis dias depois, recebi o resultado: câncer de mama. Fui sozinha à consulta e não acreditava no que estava acontecendo. Eu me lembrava da minha mãe dizendo que jamais teria algo do gênero porque não tínhamos histórico na família. O tumor estava em estágio inicial e dava para tratar. Saí do consultório aos prantos. Procurei outros médicos, mas o parecer era sempre o mesmo. Optei pelo primeiro especialista, que não indicava a mastectomia, o método de retirar a mama de uma vez. Segundo ele, poderíamos retirar só o local onde estava o tumor e uma pequena área em volta, sem sofrer qualquer alteração estética.
Fiz a cirurgia menos de um mês depois do diagnóstico, e me senti mais saudável com aquilo fora de mim – na prática, não tinha mais câncer. Foi a melhor parte do tratamento, apenas um corte pequeno na auréola, nem ficou cicatriz. Tomei anestesia geral pela primeira vez na vida, fechei os olhos e, quando acordei, estava resolvido. Fisicamente eu estava igual. A quimioterapia, em compensação, foi arrasadora. Eu sentia meu corpo morrer, em vários momentos achei que não aguentaria. Não respirava direito, tinha arritmia, tontura, enxaqueca e insônia, além de um cansaço descomunal. Fiquei exposta a infecções, tomava remédio para o estômago todas as manhãs e enxaguava a boca dez vezes por dia com bicarbonato de sódio para evitar aftas. Às vezes, minha língua queimava e eu não conseguia engolir. A quimioterapia me tirou o direito de viver, tive mais medo das consequências dela do que do câncer em si.
Durante esse período, recebia muito carinho e me senti muito amada por minha família. Minha mãe havia pesquisado sobre o que era bom comer durante a quimioterapia, aprendeu as receitas e fazia lancheiras que eu levava ao hospital. Parentes distantes estreitaram o contato – criei até um grupo de whatsapp com todo mundo, chamado ''Contagem regressiva'' para o final do tratamento. Eu mandava vídeos da quimioterapia, áudios e fotos e o retorno deles era um apoio a mais. O ambiente onde eu fazia o tratamento era maravilhoso, o que também ajudou muito.
"O câncer de mama ainda é cercado de falta de informação"

Foram dezesseis sessões e, durante o tratamento, perdi os pelos do corpo, menos o cabelo. Usei uma touca que fecha os vasos sanguíneos do bulbo capilar para que a química não penetre totalmente no couro cabeludo. Mesmo assim, cerca de 30% a 40% do meu cabelo caiu e cresceu encaracolado depois. Perdi as sobrancelhas e os cílios, estávamos no verão e o suor caía direto nos olhos. Quando passei para a radioterapia, pouco mais de sete meses depois do diagnóstico inicial, a médica me garantiu que o pior já tinha passado. Foram 33 sessões de radiação, mas como são diárias e duram só dez minutos, parecem ser rápidas. Com o tempo, a pele fica queimada, como uma exposição ao Sol.
Ao longo do tratamento, percebi que poderia ser uma voz para o combate e prevenção do câncer de mama. Hoje, após encarar um dos momentos mais difíceis da minha vida, me encontro muito feliz com o aqui e o agora. Minha mãe me diz que nunca me viu tão bem na vida.
A gente não precisa passar por uma dor para aprender algo, podemos aprender com a história de outras pessoas. Eu, por exemplo, deixei de ser uma pessoa tão ansiosa, preocupada com o futuro. Minha fé está mais forte. Quero compartilhar isso com outras pessoas. Ajudar mulheres a buscarem informação e tratamento.
O câncer me fez enxergar a vida de uma forma diferente. Revi minha vida afetiva, social e profissional. Assim que terminei o tratamento, eu me separei, mas até hoje, meu ex-marido e eu somos muito amigos. Eu estou me sentindo mais segura, mais tranquila, vivendo o presente e aproveitando mais a vida. Dizem que a felicidade é um estado de espírito, e eu estou realmente muito feliz com o presente.
Depoimento colhido por Mabi Barros
Foto por Felipe Cotrim


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