Levantamento da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica mediu
conhecimento do brasileiro sobre o câncer. Apenas 26% dizem entender
profundamente sobre o tema.
Por
Monique Oliveira, G1
24/10/2017
Gustavo Fernandes, presidente da
Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica e Cláudio Ferrari, diretor da
entidade, apresentam estudo (Foto: Monique Oliveira/G1)
Dois terços dos
brasileiros (67%) acreditam que as terapias alternativas são importantes para
curar o câncer, de acordo com levantamento da Sociedade Brasileira de Oncologia
Clínica realizado em julho desse ano e divulgado nesta terça-feira (24), no Rio
de Janeiro. A pesquisa também mostra que 26% acreditam que apenas a estimulação
do próprio corpo aumenta as chances de cura, como o uso de terapias de
transferência de energia com as mãos.
A entidade
entrevistou 1,5 mil pessoas nos 26 estados do Brasil e no Distrito Federal com
o objetivo de investigar o conhecimento, os hábitos, e estilo de vida dos
brasileiros em relação ao câncer.
Sobre a crença
nas terapias alternativas, especialistas ligados à entidade se dividem entre a
resignação e a preocupação em relação ao dado – enquanto acreditam que a
informação é importante e que é preciso fortalecer a ciência, também dizem que
de nada adianta ter uma postura de enfrentamento em relação à fé.
"Os dados
mostram uma tendência ao risco e uma predileção por escolhas não
científicas", diz Cláudio Ferrari, diretor da Sociedade Brasileira de
Oncologia Clínica.
"Entendemos
que pode ser que a pessoa fique mais feliz, mas isso não pode justificar o
abandono de terapias comprovadamente eficazes".
"Já me
resignei em relação a isso. Você pode ter duas posturas: uma delas é de
acolhimento, que vai reconhecer a importância da escolha, mas tentar
estabelecer um diálogo que explique a importância do tratamento", diz
Gustavo Fernandes, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica.
O especialista
cita experiências ruins que teve em relação à fosfoetanolamina, mais conhecida
como "pílula do câncer", que acabou não tendo resultados satisfatórios
contra a doença em estudos clínicos.
"Tive duas
situações muito ruins com o caso da fosfoetanolamina, porque teve uma hora que eu perdi a paciência,
dizia para os pacientes que era um lixo mesmo, e a resposta dos pacientes a
isso não foi boa."
Informação não chega e há desconhecimento
A entidade
também identificou que o brasileiro não está profundamente familiarizado com o
tema câncer. Quatro em cada dez afirmaram ter conhecimento mediano; e 26%
afirmaram entender profundamente sobre o assunto.
O levantamento
mostrou desinformação em relação a fatores de risco – mais de um em cada quatro
brasileiros (27%) dizem não identificar relação entre câncer e sobrepeso, 26%
não relacionam o câncer com Doença Sexualmente Transmissível (DST) e 21%
acreditam que fumar de vez em quando não aumenta o risco de câncer.
"Não está
chegando informação para uma parcela significativa da população", diz
Cláudio Ferrari, diretor da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica.
"Isso é o o que nós identificamos."
Os
especialistas explicam que doenças sexualmente transmissíveis, como a hepatite
B, podem levar ao câncer de fígado. O mesmo ocorre com o HIV, que aumenta a
chance de cânceres do tipo linfoma. Também o HPV, alvo de campanhas de
vacinação recentes, aumenta muito a chance de câncer de colo de útero. "A
relação é quase causal", explica Fernandes.
Sobre a
obesidade, eles apontam que a gordura gera fatores de crescimento de tumores,
que podem contribuir para o aumento da incidência. A obesidade também deflagra
um estado inflamatório crônico que também aumenta a chance de surgimento de
células cancerígenas – o câncer de endométrio é um exemplo de condição
associada à obesidade.
Em relação ao
cigarro, não há uma dose segura para o consumo, apontam. "Não existe a
possibilidade de fumar e ter zero dano", diz Fernandes.
"Quando
você fuma, você se expõe a 200 substâncias cancerígenas. Claro, que a
frequência dessa exposição é importante, mas tem a especificidade de cada
indivíduo, não se sabe o quanto pode ser seguro", diz. "O que se sabe
é que 95% dos cânceres de pulmão estão relacionados ao cigarro", completa.
Ter conhecimento não significa agir, pontua o estudo
Os dados também
mostram uma disparidade entre conhecimento e prática – como também demonstram
que, mesmo o conhecimento prático é falho e superficial, carecendo de
informações mais precisas.
Por exemplo,
embora 21% afirmem que fumar ocasionalmente não leva ao câncer, 93% disseram
que o tabagismo é o principal vilão do câncer.
Ainda, 23% da
população desconhece que urinar sangue pode ser um sinal de câncer e 21%
desconhece que sangue na urina também é um sinal. "É inacreditável que
indivíduos com alto poder aquisitivo passem um ano urinando sangue para
procurar um médico. E tem casos assim", diz Fernandes.
A disparidade
entre teoria e prática se repete quando o assunto é adoção de exames
preventivos. De acordo com o estudo, 80% dos entrevistados afirmaram que
deveriam fazer check-ups, mas apenas 49% realmente o fazem. Outro dado que
chamou a atenção da entidade é que 24% não faz nenhum tipo de exame preventivo.
"A
primeira pessoa que tem que cuidar de você é você mesmo. E isso é importante
que seja dito", diz Gustavo Fernandes, presidente da Sociedade Brasileira
de Oncologia Clínica.
Os brasileiros
também supervalorizam o peso da herança genética no surgimento do câncer –
índice que foi registrado em 84% dos entrevistados.
Medo da doença, mas há otimismo
O brasileiro
também tem medo do câncer, mas esse medo não necessariamente vira ação
preventiva: 41% dos entrevistados disseram ter muito medo na doença. Desse
grupo, 21% não faz nenhum tipo de exame preventivo. "Nós vimos que o medo
não mobiliza as pessoas. Ele é um mau conselheiro", avalia Ferrari.
Apesar do medo,
os brasileiros acreditam na possibilidade de cura – 80% das respostas disseram
ser possível vencer a doença. Também 79% relataram acreditar na junção de
tratamentos já existentes para superar a condição, enquanto 78% citaram o poder
da fé.
O estudo também
mostrou que há grande desconfiança do brasileiro em relação à atuação dos
governos nos serviços de saúde: 73% relataram que não confiam na atuação do
governo.
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