Professor da UFMG acrescenta vírus HIV a uma célula
modificada e verifica que ela se torna capaz de agir diretamente no tumor
glioblastoma, o mais frequente a atingir o cérebro
Estado de Minas - 05/11/2016 08:53
Uma célula carregadora que, quando modificada geneticamente
e acrescida do vírus HIV, é capaz de produzir uma proteína antitumoral e se
deslocar diretamente até células doentes para tratá-las foi descoberta por uma
equipe de cientistas, sendo um deles professor da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG). Segundo o pesquisador e biomédico Alexandre Birbrair, testes da
célula em camundongos doentes comprovaram sua efetividade no tratamento do
glioblastoma, forma mais frequente de câncer cerebral, segundo o Instituto
Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca).
Um estudo feito há dois anos pelo Inca mostra que o
glioblastoma representa cerca de 40% a 60% de todos os tumores primários do
sistema nervoso central (SNC), sendo mais comum na vida adulta. No Brasil,
entre 2015 e 2016, eles somaram 5.400 novos casos da doença. Desses, entre 2
mil a 3 mil casos são de glioblastoma, e correspondem a 2,5% de todos os
tumores. Em Minas Gerais, a proporção é de quatro casos para cada 100 mil
habitantes.
A pesquisa do Inca mostrou também que a incidência dos
tumores cerebrais é ligeiramente mais alta no sexo masculino em comparação ao
sexo feminino. E quanto maior o nível socioeconômico da pessoa, maiores são as
taxas de incidência desse tipo de tumor. As causas do aparecimento de tumores
do SNC ainda são pouco conhecidas, tendo apenas alguns fatores identificados,
como a irradiação de raios X. Traumas físicos na região da cabeça e traumas
acústicos, como casos de trabalhadores expostos a alto nível de som e ruídos,
também são possíveis fatores de risco.
O glioblastoma é um tipo de câncer complexo por vários
motivos. O professor Birbrair explica que ele se instala no centro do cérebro,
mais precisamente no sistema nervoso central, e sua tendência de formar
metástases rapidamente dificulta os tratamentos. Outro fator complicador é a
presença de uma membrana protetora, chamada hematoencefálica, que filtra a
chegada dos medicamentos ao cérebro. O prognóstico não é bom. A maior parte dos
pacientes tem baixa sobrevida depois do diagnóstico, de poucos anos, até meses.
A PESQUISA - Alexander Birbrair conta que em seu estudo
sobre células neurais cerebrais, ainda nos laboratórios da UFMG, percebeu que
as células-tronco neurais eram atraídas pelo glioblastoma e migravam até ele.
Essa célula então poderia assumir uma função transportadora, que serviria para
levar o tratamento diretamente às células afetadas pelo câncer, isentando as
células saudáveis.
Porém, as células neurais cerebrais são produzidas unicamente
pelo cérebro e para fazer uma biópsia seria necessário remover um pequeno
pedaço dele, o que inviabilizaria seu cultivo. Fazendo biópsia de
células-tronco do músculo esquelético, Alexander e sua equipe descobriram que
uma célula chamada pericito, quando mudada geneticamente, adquire a mesma
função migradora das células neurais cerebrais. Por ser criado no farto e
acessível sistema musculoesquelético, o cultivo do pericito é possível.
saiba mais
Após a descoberta dessa nova célula, chamada pelos cientistas
de neural-like stem cells (NLSC), o pesquisador então entrou em contato com um
cientista especialista em glioblastoma da Universidade de Wake Forest, na
Carolina do Norte, nos Estados Unidos, onde deu continuidade à sua pesquisa. Na
etapa seguinte, os pesquisadores testaram em camundongos doentes com
glioblastoma se a célula modificada seria capaz de migrar até as doentes.
“Colocamos em um lado do cérebro células do tumor, tingidas
de vermelho, e do lado oposto as células modificadas, de cor verde. As células
não só migraram para o tumor primário, como também migraram para todas as
extremidades, inclusive para os tumores secundários. Acreditando que elas são
boas carregadoras, entregaríamos para as células 'coisas' que podem destruir
câncer”, explica o biomédico.
Para combater o glioblastoma, os pesquisadores verificaram
que uma proteína chamada trail havia sido comprovada no combate ao tumor.
Contudo, ela é barrada pela membrana protetora do cérebro. Seria então
necessário fazer com que a própria célula modificada produzisse a proteína.
“Para isso, usamos um vírus HIV modificado (sem a carga viral, para não
contaminar as pessoas), pois ele tem a característica de alterar o DNA das
células. O vírus, então, possibilitou que a célula NLSC produzisse a proteína
necessária para combater o glioblastoma”, esclarece o professor da UFMG.
Nenhum comentário:
Postar um comentário